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[Resenha] Um Amor Feliz

Minha vontade é transcrever os poemas de Wisława Szymborska (pronuncia-se Vissuáva Chembórska) todos aqui, para convencê-los de imediato de sua genialidade. Tenho, no entanto, apenas algumas linhas para cumprir essa missão. Espero fazer jus à capacidade de concisão, que é uma das marcas de Szymborska, sintetizando, em poucos parágrafos, por que a coletânea Um Amor Feliz (Companhia das Letras, 327 páginas) deve ser sua próxima leitura.

A primeira razão é, sem dúvida, a sagacidade de sua poesia. A amplitude um tanto assustadora do mundo e a beleza por vezes cruel dos detalhes são comuns à obra da poeta polonesa, que ganhou o Nobel de Literatura em 1996. Com um olhar aguçado sobre a realidade, Szymborska extrai reflexões essenciais de momentos que, para a maioria das pessoas, soam banais. No poema Elegia de Viagem, por exemplo, a fugacidade do instante, tão corriqueira na vida de um turista, ganha forma em belos versos:

Tudo meu, nenhuma posse,
nenhuma posse para a lembrança,
mas meu enquanto olho.

(…)

Da cidade de Samokov só a chuva
e nada além da chuva.

Paris do Louvre às unhas
em brancura se vela.

(…)

Saudação e despedida
numa única olhada.

Para o excesso e a falta
um só mover do pescoço.

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ausência

tenho te escrito com calma
cartas em um caderno azul
arranco da espiral e não posto
por preguiça ou nem morta
tenho medo da espera
durante dias ou semanas um animal horrível
(espécie de raposa) vai me perseguir
por dentro, ou serei eu mesma
(um rato?) a me roer
enquanto a resposta não chega
perco muito tempo tentando
dar nomes aos bichos
que sobem a cortina do quarto

 

Alice Sant’Anna em Rabo de Baleia

[Lista] 24 livros para ler em 2018 (parte 1)

Mais poesia e mais mulheres: esse é o tom da minha lista de leituras para 2018! Hoje, eu trago 12 livros que quero ler neste ano e, na próxima semana, é a vez de a Tatá listar os escolhidos dela.

1. Amiga de Juventude, de Alice Munro, será meu reencontro com essa canadense Nobel de Literatura e rainha das narrativas breves. O livro reúne dez contos em que episódios cotidianos versam sobre a delicadeza dos relacionamentos, como amizades, casamentos e relações entre pais e filhos.

2. As Alegrias da Maternidade, de Buchi Emecheta, veio no kit de outubro da Tag Livros, indicado pela maravilhosa Chimamanda Ngozi Adichie. Esse é o primeiro livro de Emecheta publicado no Brasil. Seu trabalho aborda temas como escravidão, independência feminina, maternidade e liberdade. Alguma dúvida de que será uma ótima descoberta?

3. Bel-Ami, de Guy Maupassant, está aqui para reafirmar meu compromisso com os clássicos e com a literatura francesa. Mestre da narrativa curta, Maupassant publicou também seis romances, entre eles Bel-Ami, que é um dos mais célebres e tem como cenário a Paris da belle époque.

Quando do seu lançamento, o escritor confidenciou a um amigo: “Espero que ele satisfaça aqueles que me cobram algo mais extenso”. Considerando que, 133 anos após sua publicação, o romance ainda aparece em listas de leituras, podemos dizer que Maupassant mais do que satisfez as cobranças!

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“Ausência

Por muito tempo achei que a ausência é falta.
E lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,
que rio e danço e invento exclamações alegres,
porque a ausência, essa ausência assimilada,
ninguém a rouba mais de mim.”

 

Carlos Drummond de Andrade em O Corpo

[Divã] Histórias da Flip, parte 2

Ela sobe ao palco. É magra, jovem, de vestido com miúdas estampas animais e cabelo curto. Sua figura não nos prepara e nem antecipa a potência do discurso que vem a seguir. A poeta pernambucana Adelaide Ivánova participou da série Fruto Estranho, que convidou autores a fazer intervenções  e performances antes de seis mesas da programação do Auditório  da Matriz, uma das novidades, da Flip  (Festa Literária Internacional de Paraty) de 2017. Seu texto começou assim:

O problema não é que as pessoas lembrem por meio de fotos, mas que só se lembrem das fotos. Lembrar, cada vez mais, não é recordar a história, e sim ser capaz de evocar uma imagem.

Na foto preto e branco, o corpo de Angela Diniz está de bruços, descalço, de blusa e meia calça, sem a parte de baixo da roupa. Sangue na altura da cabeça. Angela Diniz foi assassinada em 1976 pelo namorado, com três tiros no  rosto e um na nuca.

A foto do corpo de Angela está online.

Ivánova prosseguiu em voz firme, por pouco mais de dez minutos, a relatar minuciosamente feminicídios que ocorreram há poucos ou muito anos, durante o período democrático ou na ditadura, casos célebres e mortes esquecidas pela imprensa, sempre nos lembrando que as fotos desses corpos estão online.

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