Clube do livro (página 10 de 27)

Que leitor nunca sonhou em fazer parte de um clube do livro? Essa é a hora! Vamos selecionar um título e queremos que você leia e discuta com a gente!

[Entrevista] Scholastique Mukasonga

“Minha mãe era uma contadora de histórias reconhecida. Ela não sabia nem ler nem escrever e desconhecia o francês. Mas se eu tenho qualquer talento para escrita, é a ela que eu devo essa habilidade. Mais do que o título de escritora, reivindicarei o de contadora de histórias.”

Todos nós que acompanhamos a leitura de Nossa Senhora do Nilo não hesitamos em dar esse título a Scholastique Mukasonga. A desenvoltura para narrar uma grande história a partir de curtos episódios e personagens emblemáticos é marcante em sua obra.

Por essas qualidades, sua obra tem recebido grande reconhecimento. O primeiro título de Scholastique Mukasonga, Inyenzi ou les Cafards, obteve o reconhecimento da crítica e alcançou grande público na França. O segundo, A Mulher de Pés Descalços, levou o prêmio Seligmann 2008 “contra o racismo, a injustiça e a intolerância”. O terceiro, L’Iguifou, foi coroado pelo prêmio Renaissance, e o quarto, Nossa Senhora do Nilo, pelo prêmio Renaudot 2012.

Nascida em Ruanda, a escritora vive hoje na região da Baixa Normandia, na França. Comunicamo-nos com ela por e-mail e fomos extremamente bem acolhidas. Desde o primeiro contato, a autora se mostrou saudosa do sol do Brasil e dos brasileiros. A todo momento, ressaltou o quanto se sentia grata pelo tempo que dedicamos à leitura atenta de Nossa Senhora do Nilo e se mostrou interessada em conhecer as opiniões de seus leitores.

Estamos muito felizes de encerrar nosso oitavo Clube do Livro com uma participação tão especial!

Confiram, abaixo, a entrevista na íntegra.

Achados & Lidos: O que mais nos impressionou em Nossa Senhora do Nilo foi a sua habilidade para contar histórias. A grande narrativa se forma a partir do conjunto de pequenas histórias, com muita sutileza. Em A Mulher de Pés Descalços, você comenta que sua mãe era uma grande contadora de histórias. Ouvi-la era um momento especial em família. A oralidade que marca sua literatura é uma influência e, ao mesmo tempo, uma homenagem à sua mãe? Você acredita que a arte de contar histórias é a base da literatura?

Scholastique Mukasonga: Os povos que, como os ruandeses, não conheciam a escrita, não tinham uma verdadeira literatura. Diferentes gêneros (poesias de guerra, pastorais, narrativas históricas etc.) eram praticados na corte real. Os contos populares reservavam-se, sobretudo, às mulheres. Eu fiz uma espécie de patchwork de temas no capítulo IX de A Mulher de Pés Descalços [O País dos Contos].

Minha mãe era uma contadora de histórias reconhecida. Ela não sabia nem ler nem escrever e desconhecia o francês. Mas se eu tenho qualquer talento de escritora, é a ela que eu devo essa habilidade. Mais do que o título de escritora, reivindicarei o de contadora de histórias.

Achados & Lidos: O que acontecia no liceu Nossa Senhora do Nilo era apenas uma amostra do que se passava em Ruanda na época. Por que você escolheu o liceu para ambientar essa narrativa, com personagens tão jovens?

Mukasonga: Se o romance não fosse autobiográfico, o liceu Nossa Senhora do Nilo jamais teria existido. Eu me servi do liceu que frequentei, Notre-Dame de Citeaux, em Kigali. O liceu é um microcosmo da Ruanda dos anos 70, onde se desenhavam as premissas do genocídio de 1994. Ele me permitiu conservar a unidade de lugar (o liceu) e a unidade de tempo (um ano escolar correspondente à longa temporada de chuvas).

Achados & Lidos: Assim como em A Mulher de Pés Descalços, em que as mulheres têm um papel central na narrativa, em Nossa Senhora do Nilo, a questão feminina também é bastante presente. O episódio da primeira menstruação, todas nós, leitoras, sentimos o peso que carregamos por sermos mulheres. Você acredita que as escritoras têm um papel importante em relatar essa situação e contribuir para mudá-la?

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[Nossa Senhora do Nilo] Semana #10

A oitava edição do Clube do Livro do Achados & Lidos nos levou a conhecer um pouco mais sobre a trágica  história de um país afogado em uma guerra civil. Em Nossa Senhora do Nilo, Scholastique Mukasonga narra a história de um liceu e de suas alunas, mas na verdade ela nos mostra um cenário muito mais amplo. Por meio de histórias fragmentadas, aos poucos Scholastique compõem um mosaico da crescente tensão política e forte intolerância étnica que marcaram a história de Ruanda na segunda metade do século XX. Por meio desse panorama, o livro nos mostra como pode germinar o ódio que levaria ao assassinato de 800  mil tutsis cerca de duas décadas depois do momento em que se passa essa narrativa.

Nos comentários que recebemos de nossos leitores, são esses os componentes que mais se  destacam, assim como o grande poder da literatura  de nos colocar de cara com realidades importantes, mas distantes do nosso cotidiano.

Foi uma ótima leitura, mas ainda temos uma surpresinha para nossos leitores, antes de partirmos para a leitura de Laços, de Domenico Starnone. Scholastique Mukasonga, que já tinha mostrado sua gentileza e simpatia ao fazer uma palestra nas ruas de Paraty, enquanto a ouvíamos falar sentados no chão de pedras da cidade histórica, mais uma vez demonstra sua vontade de se aproximar de seus leitores e a contínua busca por espalhar uma história que a marcou profundamente. Gentilmente, ela aceitou nosso pedido e nos concedeu uma entrevista por e-mail, que publicaremos na próxima semana! Estamos muito felizes, e esperamos que vocês gostem do resultado!

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[Nossa Senhora do Nilo] Semana #9

O final de Nossa Senhora do Nilo escancara o ódio que ficou implícito ao longo de todo o romance. Terminamos a leitura com um nó na garganta, apreensivos principalmente porque sabemos o final dessa história, que em nada lembra a sutileza do texto de Scholastique Mukasonga. Agradecemos a companhia de todos por aqui e esperamos seus comentários sobre a leitura! Na próxima semana, publicaremos as impressões dos nossos leitores. Para participar é só escrever para blogachadoselidos@gmail.com ou deixar sua avaliação aqui embaixo!

Por Mariane Domingos e Tainara Machado

A violência rondou toda narrativa de Nossa Senhora do Nilo. Ela estava ali, à espreita, em cada episódio relatado. As atitudes e falas cotidianas das garotas do liceu já anunciavam o desfecho trágico.

É interessante como Mukasonga retorna, no fim da narrativa, aos elementos que compuseram seu início. Os preparativos para a instalação da nova imagem da santa lembram o primeiro capítulo, em que outra configuração social, com os tutsis no poder, presencia o mesmo espetáculo. A santa muda, os espectadores mudam, mas a sede pelo poder, impregnada na cena que se repete, é a mesma. É um ciclo, em que os dominantes se alteram, mas a necessidade de subjugação permanece.

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[Nossa Senhora do Nilo] Semana #8

Como o ódio se espalha e se impregna em uma sociedade? No último capítulo de Nossa Senhora do Nilo, Scholastique Mukasonga relata uma história que nos lembra a velha máxima da propaganda nazista: uma mentira dita mil vezes torna-se realidade. Na próxima semana, encerramos  mais um Clube do Livro do Achados e Lidos, com a leitura do último capítulo de Nossa Senhora do Nilo.

Por Mariane Domingos e Tainara Machado

As tensões sociais e disseminação de ódio que podem levar uma sociedade a entrar em guerra civil, virtualmente eliminando toda uma população, parecem inconcebíveis, à distância. Em Nossa Senhora do Nilo, no microcosmo do liceu, contudo, Scholastique Mukasonga revela, por meio de um episódio aparentemente banal, qual era o contexto social que possibilitou, 30 anos mais tarde, o genocídio de mais de 800 mil tutsis, no início da década de 90.

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[Nossa Senhora do Nilo] Semana #7

A visita da rainha da Bélgica ao liceu foi a história central do último capítulo lido. A partir dessa anedota, Scholastique Mukasonga trabalha um tema universal e complexo – o perigo quando uma imagem se distancia demais da realidade que pretende representar. Para a próxima semana, avançamos mais um capítulo, até a página 231.

Por Mariane Domingos e Tainara Machado

O retrato do presidente vigiando todas as casas ruandesas. As fotos dos astros ocidentais, capas de revista da época, fixadas nas paredes do dormitório das adolescentes. Os esforços para a perfeição durante a visita real. A rainha vestida de branco, sem uma manchinha sequer. O que esses trechos do último capítulo lido têm em comum? Todos eles acabam na discussão acerca do poder da imagem para construção da autoridade e para desconstrução de uma realidade.

Para o chefe de um Estado recém formado, ter o seu retrato nas casas dos cidadãos é uma forma de legitimação, ainda que muitos deles nem desconfiem do porquê desse ato. A imagem, embora não fale, está ali, marcando território e representando o poder e a lealdade.

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