Autor: Tainara Machado (página 7 de 38)

Foi à mesa que a mulher do médico expôs o seu pensamento, Chegou a altura de decidirmos o que devemos fazer, estou convencida de que toda a gente está cega, pelo menos comportavam-se como tal as pessoas que vi até agora, não há água, não há electricidade, não há abastecimentos de nenhuma espécie, encontramo-nos no caos, o caos autêntico deve de ser isto, Haverá um governo, disse o primeiro cego, Não creio, mas, no caso de o haver, será um governo de cegos a quererem governar cegos, isto é, o nada a pretender organizar o nada, Então não há futuro, disse o velho da venda preta, Não sei se haverá futuro, do que agora se trata é de saber como poderemos viver neste presente, Sem futuro, o presente não serve para nada, é como se não existisse, Pode ser que a humanidade venha a conseguir viver sem olhos, mas então deixará de ser humanidade, o resultado está à vista, qual de nós se considerará ainda tão humano como antes cria ser.”

 

José Saramago em Ensaio sobre a Cegueira

[Lista] 10 livros para o desafio Histórias do Quintal

A querida Angela Alhanati, do Ao Sol No Quintal (@aosolnoquintal), nos convidou a participar de um desafio super bacana que ela está promovendo no canal dela. São 10 categorias diferentes que mostram livros que nos fizeram rir, chorar, que marcaram nossa adolescência e nossa vida.

Ao escolher esses títulos, acabamos também contando um pouco dos nossos gostos pessoais e de episódios que nos moldaram: afinal, nossas leituras acabam também definindo nossa personalidade.  

Esperamos que vocês gostem!

Ah, se quiserem participar, é só usar a hashtag  #historiasdoquintal e seguir as categorias abaixo. E, claro, não deixem de marcar o Achados & Lidos também!

1) Um livro triste: Vozes de Tchernóbil, de Svetlana Aleksievitch:

Quando começamos o Achados & Lidos, decidimos que o primeiro título do nosso Clube do Livro seria Vozes de Tchernóbil, da ganhadora do Prêmio Nobel de 2015.

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[Resenha] Infância

A realidade árida da savana sul-africana dá o tom do primeiro volume da trilogia de ficção autobiográfica de J. M. Coetzee, um dos maiores escritores contemporâneos. Em Infância – Cenas da Vida na Província (Companhia de Bolso, 150 páginas), Coetzee relata, com a secura que lhe é habitual, seus anos de formação, em busca de uma identidade que não parece estar em lugar nenhum.

A casa em Worcester, para onde mudaram por causa do pai, que tem dificuldade em se fixar em um emprego, é simples, idêntica a todas as outras. O garoto não consegue se habituar ao local, à brutalidade do entorno.

A infância, segundo a Enciclopédia das Crianças, é uma época de felicidade inocente, que se vive nas campinas entre flores e coelhos, ou  junto à lareira absorto num livro de contos. É uma visão da infância totalmente alheia a ele. Nada do que vive em Worcester, em casa ou na escola, o faz pensar que a infância seja mais que uma fase de engolir a seco e suportar.

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[Divã] Não fui eu e a crise da democracia brasileira

A democracia brasileira está em crise. A cinco meses das eleições presidenciais de 2018, a lista de candidatos é tão longa quanto assustadora, e nenhum dos nomes parece realmente viável. É possível que 2019 seja tão caótico quanto foi 2015, com perdedores contestando o resultado e um Congresso acuado pelas denúncias da Lava-Jato. Ao mesmo tempo, apesar da crise econômica que fez mais de 12 milhões de desempregados e colocou milhões em situação de pobreza extrema, a sociedade parece viver um grande período de apatia.

Essa falta de posicionamento para além das redes sociais, onde se concentra a indignação do brasileiro, é assustadora, mas talvez não seja uma “jabuticaba”, como gostamos de chamar os problemas exclusivamente brasileiros. Na edição de abril, a revista piauí trouxe um especial sobre o momento político mundial, em que a estima da democracia no mundo está em declínio, sem que ninguém saiba exatamente qual será o sistema político que pode vir a suprir esse vácuo.

O sociólogo Celso Rocha de Barros, em seu excelente ensaio sobre O Brasil e a Recessão Democrática, mostra que a crise brasileira até pode ser coisa nossa, com um desarranjo econômica avassalador produzida internamente e um quadro político que soma um ex-presidente preso, uma presidente alvo de impeachment, três  ex-governadores do Rio de Janeiro atrás das grades e conversas inescrupulosas entre o atual mandatário do país e um dos mais conhecidos empresários brasileiros – hoje também em uma cadeia.

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“É foda sair do beco, dividindo com canos e mais canos o espaço da escada, atravessar as valas abertas, encarar os olhares dos ratos, desviar a cabeça dos fios de energia elétrica, ver seus  amigos de infância portando armas de guerra, pra depois de quinze minutos estar de frente pra um condomínio com plantas ornamentais enfeitando o caminho das grades, e então assistir adolescentes fazendo aulas particulares de tênis. É tudo muito próximo e muito distante. E, quanto mais crescemos, maiores se tornam os muros.”

 

Geovani Martins em O Sol na Cabeça

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