Os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro começaram há pouco menos de duas semanas e, desde então, tenho dedicado praticamente 18 horas por dia aos dezesseis canais de transmissão disponíveis. São, portanto, muitas horas que eu subtraí da minha rotina semanal de leitura, reduzindo dramaticamente minhas chances de bater recordes literários em 2016.
Da lista de 10 livros para ler em 2016 que postei no blog no início do ano, por enquanto posso marcar check em um nada honroso total de de 4 volumes. Com certeza, um resultado que não me coloca em pódio nenhum. Claro que sempre aparecem outro títulos para roubar a nossa atenção – caso de Elena Ferrante com sua série napolitana, por exemplo -, mas o fato é que ler tudo o que gostaríamos é uma impossibilidade material que, muitas vezes, causa certa depressão aos leitores de carteirinha.
Lembrei do assunto quando a Mari comentou comigo um episódio de Gilmore Girls (disponível no Netflix, outro forte concorrente na luta por tempo disponível). Na terceira temporada, Rory visita a biblioteca de Harvard (ou as bibliotecas, já que são mais de 70) e descobre que naqueles prédios estão mais de 16 milhões de volumes. Ela entre em parafuso porque “só” tinha lido 300 livros até ali e começa a fazer cálculos do quanto ainda precisava acumular em páginas para dar conta de toda a literatura disponível no mundo.
Compartilho a frustração de Rory em gênero, número e grau. Esse sentimento é ainda mais forte quanto nos questionam se todos aqueles itens acumulados nas prateleiras já têm o selo de “devorado” estampado em suas páginas. Infelizmente, a resposta é, quase sempre, não. Em primeiro lugar, como sempre me lembra a Mari com base numa frase do peruano Mario Vargas Llosa, a chance de um livro ser lido é maior se ele estiver na nossa prateleira do que lá na livraria.
Nem mesmo José Mindlin, leitor compulsivo, dono da maior coleção privada de livros do Brasil, poderia ter dado cabo de toda sua biblioteca. E olha que, nessa categoria, provavelmente ele teria o status de Michael Phelps como um dos maiores atletas da história: seu ritmo era de impressionantes mil e quinhentas páginas por mês, ou mais ou menos cem livros por ano. Dizem que ele lia até mesmo quando estava na direção, nos semáfaros fechados ou no trânsito parado (nós, do Achados & Lidos, consideramos essa uma prática quase tão perigosa quanto caçar Pokemons no trânsito. Não recomendamos!).
Apesar de reconhecermos os limites do possível nessa atividade a qual nos dedicamos diariamente, ler mais é sempre um objetivo presente nas nossas promessas de começo de ano. Como um esporte, exige certa disciplina, foco e dedicação.
Alguns traçam metas: 15 páginas de Graça Infinita, do David Foster Wallace, por dia é suficiente para encerrar o livro em um prazo de 2 meses e meio. Um artigo sugerido certa vez por um leitor traçava outras estratégias para encerrar o ano com um bom saldo de livros. Uma dica era não desperdiçar tempo com notícias, algo difícil no meu caso, que trabalho em jornal e preciso manter um mínimo de sintonia com o cotidiano. Outra era reduzir o contato com familiares e amigos ao mínimo possível, o que pode ser a garantia de medalha de ouro na competição, mas sem muita simpatia da torcida.
Outra estratégia é, claro, priorizar leituras. Não perder tempo com autores dos quais você já sabe que não gosta ou com um livro que só recebeu críticas ruins pode ajudar na hora de melhorar os resultados. Ao mesmo tempo, o foco excessivo pode te impedir de conhecer novos escritores ou mesmo de conceder uma merecida segunda chance para algum autor interessante, mas que você encontrou no momento errado da vida.
Diante dessas barreiras, cheguei à conclusao que para aumentar o tempo disponível de dedicação à leitura, o jeito é mesmo criar um movimento e advogar pela inclusão de maratonas literárias como esporte olímpico. Nesse campeonato, haveria categorias diferentes, com peso leve para livros com menos de 150 páginas, meio-pesado para até 300 páginas e tijolão para os grandes volumes, de mais de 700 folhas. Tal qual numa corrida de longa distância, esses títulos certamente exigem perseverança e disciplina do leitor.
As modalidades não acabam por aí. A prova de leitura com barreiras, dentro de ônibus muito lotados, com certeza seria disputadíssima. E para encerrar os jogos, teríamos uma prova de resistência: a leitura de Ulisses, de James Joyce. Quer ganhar ouro? Deixe nos comentários suas sugestões de esportes literários!
PS: Minha meta para as férias era ler Os Buddenbrook, de Thomas Mann, um calhamaço de 679 páginas. Enquanto os atletas acumulam medalhas, eu amargo pouquíssimas páginas lidas. Mas foi por uma boa causa!
Tainara Machado
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15 de agosto de 2016 at 21:37
Que post maravilhoso! As Olimpíadas destruíram minha vida acadêmica, social e toda minha programação de leitura. Havia me programado para findar Guerra e Paz nesta semana, mas eis que foram tantas provas perfeitas do Phelps, Simone Biles, jogos de futebol, esgrima (não entendo nada, mas naquele momento me pareceu muito emocionante) outros e outros que fizeram com que empacasse na página 1450 .
Uma coisa é certa, buscarei inspiração no deus jamaicano e, como Bolt, pretendo fazer meus 100m rasos, finalizar as 1000 páginas restantes e manter minha meta. Conseguirei? Pouco provável! Mas temos licença esportiva… São 15 dias de 4 em quatro anos.
24 de agosto de 2016 at 18:26
Ana, espero que suas leituras já tenham voltado à programação normal, com o fim das Olimpíadas! Não há jeito melhor para curar o vazio deixado pelo fim dos jogos! rs Só nos resta ver se no próximo ciclo literário teremos um desempenho comparável aos dos grandes nomes do esporte!