[Lista] 5 personagens queridos

Sabe aquele personagem que deixa saudade quando a leitura termina? Ou que dá vontade de conhecer, abraçar e conversar? Ou ainda que parece tão real, que você tem até um rosto bem definido e uma voz para ele? Hoje é dia de personagens queridos na Lista da Semana!

1. Jean Valjean: já comentei em um Leitor no Divã aqui no blog que uma das minhas maiores dificuldades na leitura de Os Miseráveis surgiu depois que terminei o livro. Não conseguia me desapegar do personagem Jean Valjean. Como o próprio título antecipa, o clássico romance de Victor Hugo não trata de histórias de vida fáceis ou tranquilas. Ele fala de gente miserável, que sofre de tudo e mais um pouco. Jean Valjean é um deles. Quando parece que sua vida vai entrar nos eixos e ele irá aproveitar a paz que merece, acontece outra desgraça. A força, a persistência e a generosidade do personagem diante das rasteiras que a vida lhe dá cativam qualquer leitor. Uma das partes mais bonitas (e longas) do livro é talvez a mais representativa de quem é Jean Valjean. Estou falando do trecho em que ele foge pelos esgotos de Paris, carregando, nas costas, o futuro genro gravemente ferido. Como se não bastasse, encontra todos os tipos de perigo pelo caminho. É ou não é um super-herói? <3

2. Helena: eu sou fã de carteirinha de Machado de Assis. Para mim, ele é gênio da literatura mundial. Helena está longe de ser seu melhor ou mais conhecido romance, mas é um dos meus preferidos. Já perdi a conta de quantas vezes o li. Passei a gostar do nome Helena por causa desse livro. Tenho um carinho especial pela edição antiga da Ática, da Série Bom Livro, bem comum em colégios por sua organização didática. O que me atraiu nessa edição, e me fez escolher o livro na biblioteca da escola, foi a ilustração de uma mulher belíssima na capa, de olhar forte, contrastando com uma roupa delicada e uma flor em suas mãos. De cara, gostei daquela Helena.

A obra representa a transição da fase romântica para a fase realista de Machado. Ainda há resquícios de história água com açúcar, típica do modelo de romance romântico. Mas a escrita inteligente de Machado, sobretudo nas análises ácidas dos costumes, sociedade e política da época, não deixa o livro cair em estereótipos. O mistério que envolve a personagem Helena equilibra um pouco a posição de vítima em que ela é colocada, tornando-a uma personagem interessante. Ela é o símbolo de uma opinião muito clara de Machado, que aparece em outros livros do escritor: o mundo e as regras da vida em sociedade são impiedosas com os desfavorecidos e genuínos. Quem se sobressai são os hipócritas, que vivem e defendem um mundo de aparência e de poder. Helena não tem a força para vencer esse cenário desfavorável, mas ainda assim é uma personagem memorável.

3. Tia Ifeoma: a força que a Helena de Machado não tem sobra na Tia Ifeoma de Chimamanda Ngozi Adichie. Há pouco, acabamos de ler o Hibisco Roxo em nosso Clube do Livro e Tia Ifeoma foi a personagem que mais me conquistou. Ela diz o que pensa (sempre com respeito), desafia padrões, cria os filhos sozinha e ainda tem uma gargalhada contagiante. Como não amar?

4. Renée: ela é uma das principais vozes de A Elegância do Ouriço, livro “tem-que-ler” de Muriel Barbery. Zeladora de um prédio de luxo no coração de Paris, Renée finge ser ignorante, para se proteger dos olhares curiosos dos patrões que, se soubessem de seus gostos refinados para arte e literatura, a considerariam uma aberração, já que foram educados segundo uma ideia simplista do mundo que não consegue ver além da aparência e da posição social das pessoas. Como bem diz Renée, trata-se da “incapacidade dos seres humanos de acreditar naquilo que explode as molduras de seus pequenos hábitos mentais”. Apesar da convivência diária com a zeladora, quase nenhum dos moradores do prédio enxerga sua elegância, que é como a elegância de um ouriço, escondida sob uma casca de espinhos. Gosto muito de um trecho do livro, logo nos primeiros capítulos, em que Renée se apresenta. Aqui, ela já me conquistou com sua inteligência e língua afiada:

Meu nome é Renée. Tenho cinquenta e quatro anos. Há vinte e sete sou a concierge, a zeladora do número 7 da Rue de Grenelle, um belo palacete com pátio e jardim interno, dividido em oito apartamentos de alto luxo, todos habitados, todos gigantescos. Sou viúva, baixinha, feia, gordinha, tenho calos nos pés e, em certas manhãs autoincômodas, um hálito de mamute. Não estudei, sempre fui pobre, discreta e insignificante. (…) Como raramente sou simpática, embora sempre bem-educada, não gostam de mim, mas me toleram porque correspondo tão bem ao que a crença social associou ao paradigma da concierge, que sou uma das múltiplas engrenagens que fazem girar a grande ilusão universal de que a vida tem um sentido que pode ser facilmente decifrado.

Renée rocks!

5. Jay Gatsby: vamos combinar que um personagem que já foi interpretado por Robert Redford e Leonardo di Caprio no cinema, não tem como ser fraco, não é? O Grande Gatsby, de F. Scott Fitzgerald, é um livro sobre glamour, festas, riqueza, egoísmo, paixões, aparências, tudo isso no ritmo frenético das saias franjadas dos anos 20. Jay Gatsby é um milionário cheio de mistérios e que comete loucuras pela fútil Daisy Buchanan. Sua fragilidade diante dessa paixão despertou minha empatia. Em vários trechos, dá vontade de dizer: “abra o olho, Jay, a Daisy é problema!”. Pena que ele não pode escutar!

E vocês, têm algum personagem querido?

Mariane Domingos

Mariane Domingos

Eu amo uma boa história. Se estiver em um livro, melhor ainda. / I love a good story. If it has been told in a book, even better.
Mariane Domingos

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2 Comentários

  1. Dos seus eu manteria Jean Valjean e Renée. Pra mim, a Helena é facilmente substituível ou pela Estela (de Iaiá Garcia; também primeira fase do Machado) ou pela maravilhosa Capitu!

    Segue minha lista controversa, mas se não fossem apenas 5 certamente teria incluído Odisseu, Emma Bovary, Baleia – Vidas Secas -, Etiénne, de Germinal, Medéia (ela sofre. Louca, mas sofre…), Alice etc:

    1. Gretchen, de Fausto. Eu choro toda vez que lembro da tragédia e todas as vezes que escuto a ópera. Dá vontade de ir lá, abraçar e falar: calma, não se desespere!
    2. Jean Valjean pelos motivos já citados no post. Ele é fantástico.
    3. Macabéa, A Hora da Estrela. Gente, pra mim a melhor e mais forte personagem de Clarice.
    4. Raskolnikóv, Crime e Castigo. Ele não é mau, só é filhote de Dostoiévski. Estava em dúvida se colocava ele ou Dimitri de Os Irmãos Karamazov pq eles estão perdidos no mundo. No fundo são boas pessoas (apesar dos pesares)…
    5.Capitu, Dom Casmurro! Maravilhosa. A melhor e mais interessante personagem da literatura brasileira.

    • Mariane Domingos

      5 de maio de 2016 at 11:15

      Amei, Ana!! E percebi que esqueci vários nomes. haha Baleia e Raskolnikóv seriam os próximos da lista, sem dúvida. E PRECISO ler Fausto, Madame Bovary e Germinal, urgente. O blog só está aumentando minha interminável lista de leituras!

      Sobre o Machado, Capitu ainda não é minha preferida, embora seja uma personagem genial, como quase tudo que ele escreveu. Ela é bem mais elaborada que Helena, mas meu apego à Helena é mais nostálgico. Uma boa leitura da adolescência, sabe? Se não me engano, foi o primeiro Machado que li – grande marco na minha vida literária. haha Antes dos “olhos de cigana oblíqua e dissimulada”, ainda colocaria a ironia do “defunto-autor” Brás Cubas e a loucura (ou sanidade?) do dr. Simão Bacamarte (O Alienista).

      Por fim, acho que deveríamos montar um fã-clube de Jean Valjean. O miserável mais querido de todos! <3

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