Encerramos a leitura de mais uma edição do nosso Clube do Livro! Gostamos muito de O Amor dos Homens Avulsos e, agora, fazemos coro a todas as boas críticas que nos levaram à escolha do título escrito por Victor Heringer. Os últimos capítulos mantiveram a força da narrativa e fecharam de maneira muito coerente a ideia que baseia a história. E vocês, gostaram da leitura de O Amor dos Homens Avulsos? Fiquem ligados: na próxima semana, teremos um post muito especial por aqui!
Por Mariane Domingos e Tainara Machado
A relação de pai e filho entre Camilo e Renato é finalmente definida. A partir das sutilezas do dia a dia, Victor Heringer mostra como os laços de cuidado e afeto vão se construindo. Dos detalhes da ceia de Natal, que neste ano deveria ser mais especial pela presença do garoto, às broncas pelas travessuras, fica claro que a ternura venceu o ódio:
Onde é que começa o amor ninguém lembra. Os gatilhos do ódio são todos fáceis (…). Aí poderia ter começado o ódio, mas não começou. Poderia ter começado quando o moleque berrou que ele não era seu pai porque foi proibido de ir para rua às oito da noite. Mas não começou.
É assim que Camilo sabe que ama o filho.
O ódio nunca começa quando pode.
Esse trecho é um ótimo resumo da ideia central de O Amor dos Homens Avulsos. Camilo passou quase uma vida sucumbindo aos “gatilhos do ódio” e a resistência veio de onde menos se esperava: do neto do assassino de seu primeiro amor. O afeto que ele sente pelo garoto irá livrá-lo da amargura do ódio e ajudá-lo a superar traumas, como o medo da rua, símbolo da violência sofrida por Cosme:
Camilo não pode negar. A rua não morde. O menino precisa da rua.
Esses laços de afeto que são estabelecidos levam a algumas mudanças importantes na narrativa. Em uma espécie de prólogo, o último trecho do livro recebe o título de Um Sol Dentro de Casa, e a partir dali passamos a observar os acontecimentos em terceira pessoa, e não mais sob a perspectiva de Camilo.
Também percebemos uma mudança de postura. Se antes a raiva que dominava Camilo o fazia acreditar que gostaria de morrer cedo e sem compartilhar a experiência dolorosa que foi o seu primeiro amor, agora ele é capaz de fazer confissões a Grumá, seu vizinho, em uma conversa íntima regada à cerveja e uísque. O sol, ou a ternura, quando voltam a preencher a vida das pessoas, deixam espaço também para que outros sentimentos conquistem compartimentos antes vazios ou abandonados, como o da amizade.
O amor é o tema central da narrativa de Heringer, mas a riqueza desse romance reside também na habilidade com que o autor extrai temas universais de uma experiência individual. O bairro do Queím, por exemplo, é um microcosmo da sociedade em que vivemos. A evolução (ou estagnação) ao longo dos anos é um recado bastante direto da invisibilidade a que grande parte da população brasileira está fadada. Quando fala sobre a regularização de sua situação em relação a Renato, temos uma frase certeira sobre a realidade que Heringer revela:
Desaparecer é fácil, aparecer é um tanto mais complicado.
Nos agradecimentos, ao final do livro, Heringer também conta um pouco mais sobre como foi o processo de criação de O Amor dos Homens Avulsos. Sua ideia era centrar a trama nas memórias do primeiro amor, essa experiência dolorida e ao mesmo tempo prazerosa, quase inescapável a quem chega à idade adulta.
Para tanto, ele abriu um site e pediu para que os leitores lhe contassem os nomes dos seus primeiros amores, e se quisessem revelassem também sua identidade.
Eles responderam. É incrível o que as pessoas respondem quando você pergunta sobre o amor delas. Muitos me contaram histórias, alguns nem deram os nomes, só me escreveram sobre seus primeiros amores.
Nesse amálgama de histórias coletivas, um trecho do livro lembra a famosa quadrilha de Drummond, “só que ninguém fica fora da história”, escreve o autor. Que Heringer tenha pinçado, entre tantos enredos possíveis, a trama de um menino deficiente que se apaixona pelo garoto pobre acolhido em sua casa só mostra a qualidade mais arrebatadora desse livro: a literatura é um espaço para se colocar no lugar do outro e mostrar como, por experiências diferentes, temos todos marcas parecidas. O primeiro amor, afinal, é ternura e dor para todo mundo.
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