Eternos começos

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Dia desses, em um café, conversávamos sobre o que é, talvez, a obra mais falada e menos lida de todos os tempos. Em Busca do Tempo Perdido, do francês Marcel Proust, é universalmente conhecido pelas frases longas, pelo texto rebuscado e pela dificuldade que é passar das 100 primeiras páginas de O Caminho de Swann – que dirá atravessar os sete volumes que compõem a obra.

Não à toa, o trecho mais popular da história é o momento em que o narrador morde uma “madeleine”, um biscoito francês, e o sabor o leva a reminiscências de sua infância em Combray.

A cena está logo nas primeiras páginas, onde a maioria dos mortais consegue chegar. Não muitos conseguiram ir além disso. Chegar a O Tempo Recuperado, então, é tarefa hercúlea – pessoalmente, não conheço ninguém que tenha completado esse trabalho.

Todo esse preâmbulo é apenas para compartilhar uma das minhas maiores aflições literárias: ficar presa no começo de um livro. Acontece com certa frequência e nem sempre porque o livro é difícil ou um grande clássico.

Há uma série de primeiras páginas que, para mim, são eternas barreiras. E olha que eu sou insistente. De tempos em tempos, pego O Som e a Fúria, de William Faulkner, mentalizo que agora vai, leio duas ou três páginas e… zzzzzzz (os fãs que me perdoem!). Na terceira noite seguida, desisto e vou para o próximo da fila. Outras leituras passam na frente e ele volta para a estante. Assim é há uns dez anos.

Em 2016, prometi que iria transpor pelo menos algum desses começos. Ganhei da minha mãe a edição comemorativa de 40 anos de publicação de O Sol Nasce para Todos. O clássico de Harper Lee, narrado por uma criança, deveria ser “a piece of cake”. Só que ele está no original, em inglês, e se passa em uma cidade do interior do Alabama, nos Estados Unidos. As falas, portanto, respeitam o sotaque típico do meio-oeste americano. Resultado: li a cena da tentativa de invasão da casa de Boo Radley umas trocentas vezes. Só conseguir ultrapassá-la quando, no mesmo café, depois do relato das minhas agruras, a Mari me provocou: “Mas é tão fácil e tão bonitinho, minha mãe adorou”. Precisava desse estímulo sempre!

Não está caminhando rápido, até porque, como é um livro lindo, tenho dó de carregá-lo na bolsa (assunto para outro Divã) e acabo me dedicando a ele apenas antes de dormir, o que funciona mais ou menos como um sonífero. Mas em breve teremos resenha por aqui. Já Mrs. Dalloway… quem sabe em 2017!

 

Tainara Machado

Tainara Machado

Acredita que a paz interior só pode ser alcançada depois do café da manhã, é refém de livros de capa bonita e não pode ter nas mãos cardápios traduzidos. Formou-se em jornalismo na ECA-USP.
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11 Comentários

  1. Que incrivel!!! muito sucesso p/ voces, meninas!!!

    To sentindo que vou passar a gostar mais de literatura graças ao blog!!

    Mil beijos,

  2. Hahahaha me identifico muito!! tem uns que não saem da estante (ou da fila) nunca!!!

    Esse blog tem a cara do sucesso!!

    parabéns meninas!

    beijos

    • Tainara Machado

      10 de março de 2016 at 15:22

      Muito obrigada, Gabi! Eu tenho uma imensa fila de livros na lista de semi-desistência. É uma tristeza! Mas vamos combater esse mal! Hahaha

  3. Hahahahah Adoreeeei!
    Vi você em cada palavrinha!
    Dá vontade de ir atras de cada citação para entender o que é
    Que o sucesso venha junto com os novos entusiastas por livros que vocês vão criar eeeee

  4. Sensacional! Estava em crise tentando passar da pagina 170 de Guerra e Paz. Um colega comentou algo que talvez faça sentido: “ainda não chegou o seu momento de ler a obra. Se você não estiver preparada e com uma bagagem não só literária, mas psicológica para ela não conseguirá prosseguir… “. O mesmo ocorre com Proust e Faulkner.

    • Tainara Machado

      10 de março de 2016 at 15:21

      Ana, bom saber que não acontece só com a gente! Gostei da filosofia da sua amiga, vou adotar para vida! Estilo relacionamento. “Se não consegui ler, era porque não era para ser lido”.

  5. Eu li “To Kill a Mockingbird” ano passado. Fiquei surpreso de como o titulo foi traduzido para o portugues… E’ um otimo livro, voce vai gostar. Voce sabia que a Harper Lee lancou ano passado uma continuacao que ela havia escrito ha muito tempo? Chama-se “Go Set a Watchman”, e conta a historia de Jean Louise Finch adulta, voltando para sua cidade natal. Esse eu ainda nao li, mas pretendo.

    • O objetivo deste ano é terminar ”O Caminho de Swann”. Já estamos quase no final de março e só o que fiz foi passar da página 100, mas tenho fé que este vai: ”voltar para a lista dos não lidos”.

    • Tainara Machado

      22 de março de 2016 at 21:55

      A tradução do título para o português é uma esquisitice mesmo, João! Vi recentemente outro leitor tão surpreso quanto você! Consegui, enfim, terminar o livro! Em breve tem resenha por aqui! Gostei bastante! Ah, e sabia que a Harper Lee tinha lançado um livro ano passado, mas não que era a continuação dessa história. Vou procurá-lo! Acho que ela sentiu que estava perto de partir, né?

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