Em outubro, a Academia Sueca anunciou o escritor nipo-britânico Kazuo Ishiguro como o vencedor do Prêmio Nobel de Literatura por “seus romances de grande força emocional, que revelaram o abismo sob nossa sensação ilusória de conexão com o mundo”. Se acertaram ou não no prêmio, é uma questão polêmica, mas não há dúvidas de que definiram com acurácia sua obra.
Não Me Abandone Jamais conta a história de três amigos de infância, Kath (a narradora), Ruth e Tommy. Eles cresceram em Hailsham, uma espécie de internato, que, à primeira vista, parece um colégio comum, mas, na verdade, esconde vários mistérios. Aquelas crianças têm algo de especial, que só é revelado a elas, e aos leitores, à medida que a história avança.
Nesse sentido, a narrativa de Ishiguro é um tanto enfadonha. Apenas por volta da página 100, o primeiro grande enigma é revelado. E, diferente de outras obras em que os silêncios e as insinuações formam um sofisticado enredo, nesse caso, não há um quebra-cabeça desafiador, que envolve o leitor. Por vezes, parece que existem apenas pontas soltas e nenhum fio condutor.
Outro aspecto que desabona o texto de Ishiguro é a artificialidade com que ele insiste em organizar as lembranças da narradora. Grandes escritores já se destacaram pela habilidade com que trabalham a memória. No entanto, não é essa destreza que o texto de Ishiguro transparece. Em vez de dar vazão aos fluxos de memória da personagem e encontrar o brilho de sua literatura nesse caos, o autor opta pelo caminho mais seguro e menos original da ordem cronológica. Não são poucos os trechos em que ele lança mão de deixas como esta: