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Lemos, gostamos (ou não) e indicamos (ou não). Aqui, colocamos nossas impressões sobre livros que, de alguma forma, nos marcaram. Tem opinião, mas não tem spoiler!

[Resenha] O Dono do Morro

De vez em quando, nós do Achados e Lidos deixamos a literatura um pouco de lado para embarcar no jornalismo. O Dono do Morro – Um Homem e a Batalha pelo Rio (Companhia das Letras, 353 páginas), do jornalista inglês Misha Glenny, é do tipo que vale a viagem.

O livro reúne as qualidades essenciais para uma boa reportagem. É bem escrito, bem apurado e, o que considero seu grande trunfo, se baseia em um dos personagens mais interessantes a emergir dos morros do Rio de Janeiro nas últimas décadas: o Nem da Rocinha.

Sua história é digna de cinema. Antônio Francisco Bonfim Lopes nasceu em uma família pobre. A mãe era empregada doméstica e passava a maior parte da semana dormindo no emprego, em um dos bairros abastados da orla do Rio de Janeiro. O pai pulava de trabalho em trabalho, mas acabou se fixando em um bar de Copacabana. Os dois bebiam e o lar tinha episódios violentos.

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[Resenha] Era Uma Vez uma Mulher que Tentou Matar o Bebê da Vizinha

Impossível ficar indiferente ao título deste livro da russa Liudmila Petruchévskaia: Era Uma Vez uma Mulher que Tentou Matar o Bebê da Vizinha. A cena sombria que ele anuncia e os ares de fábula contidos no “era uma vez” são uma ótima introdução à coletânea de contos dessa autora, que foi censurada na época do regime soviético. Hoje, Petruchévskaia é uma das escritoras e dramaturgas mais reconhecidas do seu país e chega, pela primeira vez, muito bem recomendada, às livrarias brasileiras, com essa edição da Companhia das Letras.

Sua escrita bebe na fonte fantasiosa dos contos de fadas na mesma medida em que lança um olhar afiado sobre a sociedade. Assim, Petruchévskaia se destaca por criar situações e personagens mágicos a partir de problemas reais, como a guerra, a fome, o inverno desolador, a solidão e tudo aquilo que desperta a escuridão da alma humana:

… existe um lado da vida secreto, animal, que floresce teimosamente, e é nele que se concentram as coisas detestáveis e hediondas;

Os contos dessa coletânea são habitados por fantasmas, viúvas e órfãos, uma crítica contundente aos horrores de uma nação que está sempre em combate. Mesmo depois da morte, vítimas e familiares não conseguem encontrar a paz. Em Um Caso em Sokólniki, por exemplo, um soldado morto reaparece para sua esposa para pedir um enterro digno, pois seus restos espalhadas e esquecidos não o permitem descansar.

A ausência é outro tema que perpassa a obra de Petruchévskaia. Se a morte ronda os soldados, a solidão assombra os que ficam à sua espera. Por meio de histórias fantasiosas, a escritora levanta um problema bastante real: o que será dessa geração de órfãos e viúvas?

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[Resenha] O Conto Zero e Outras Histórias

Contos são, no geral, narrativas bastante lineares. A concisão se faz necessária, e a adoção de uma estrutura narrativa mais simples, em que um personagem domina a ação até seu desfecho, é a construção que comumente funciona no gênero.

Sergio Sant’Anna, um dos maiores contistas brasileiros em atividade, subverte esse padrão em O Conto Zero e Outras Histórias (Companhia das Letras, 173  páginas, três estrelas), lançado em 2016. Logo no primeiro texto, o autor usa da metalinguagem para nos colocar de frente para a página em branco e a decisão de escrever ou não uma história, “que ficaria dias e mais dias rondando a  sua cabeça”.

O conto, que aos poucos ganha forma por meio de viagens consecutivas – de ônibus no Rio de Janeiro, de metrô em Londres -, é repleto de autorreferências sobre a infância e juventude de Sant’Anna e sua formação sentimental ao lado do irmão mais velho. Os constantes deslocamentos dos personagens parecem simbolizar a viagem no tempo em que mergulha o autor, pois também as memórias parecem vagar em nossa alma, para de repente chegar ao seu destino.

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[Resenha] As Alegrias da Maternidade

Indicação da escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie para o kit da Tag Livros de outubro do ano passado, As Alegrias da Maternidade (Tag Livros, 320 páginas), de sua compatriota Buchi Emecheta, é um romance que faz o leitor perder o fôlego a cada página. Sua narrativa é envolvente não só capítulo a capítulo mas também no todo, já que a escritora costura, com habilidade, episódios cotidianos de personagens fortes a temas áridos como gênero e raça.

Nnu Ego, proganista da história, é filha da paixão entre Agbadi, grande caçador e chefe de um tribo igbo na região de Ibuza, e sua amante Ona, jovem cujo caráter voluntarioso não se adequava aos padrões esperados de uma mulher naquele contexto.

Diferente da mãe, que não queria constituir família, apenas encontrar um homem que a engravidasse de um filho homem para que ela entregasse ao pai e garantisse a continuidade de sua linhagem, Nnu Ego esperava encontrar no casamento e na maternidade sua plenitude. Para ela, não havia outro caminho para uma vida bem-sucedida.

Em seu primeiro matrimônio, já começam as desilusões. Ela se casa com um jovem que era quase um espelho de seu pai – viril, belo, corajoso e líder. A demora para engravidar leva o marido a procurar uma segunda esposa e, quando esta logo lhe dá o que ele tanto procurava, Nnu Ego é marginalizada sob a insígnia de mulher estéril e incapaz de cumprir suas obrigações.

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[Resenha] Tudo Pode Ser Roubado

Garçonete de um famoso restaurante em São Paulo, a personagem principal de Tudo Pode Ser Roubado, romance de estreia de Giovana Madalasso (Todavia Livros, 189 páginas), está sempre à espreita de breves encontros sexuais que possam terminar com objetos de valor sutilmente furtados.

Descrita como uma “sonhadora mequetrefe”, ela parece se importar pouco com o fato de levar uma vida que muitos poderiam caracterizar como sem propósito. Suas ambições momentâneas, depois de sair do “fungo”, o apartamento sem incidência de luz solar em que morou quando chegou a São Paulo, envolvem dar entrada no seu apartamento e não ser demitida do trabalho no restaurante, onde a galeria de alvos potenciais para seus roubos é extensa.  

Seu cotidiano vazio acaba sofrendo uma reviravolta quando é procurada por um tipo duvidoso. Chamado de Biel, o personagem, espécie de pilantra profissional, lhe traz uma proposta arriscada e inusitada: o roubo de um livro raro, usando suas táticas de sedução para subtraí-lo da casa de um professor. O colecionador que contratou os serviços do vigarista nos remete quase imediatamente a Charles Cosac, ex-dono da editora que levava o seu nome e de um sócio (Cosac & Naify). Descrito neste perfil do jornal Valor Econômico como um colecionador voraz de obras de arte, Cosac é de uma personalidade marcante, capaz de levar os dedos do avô falecido pendurados no pescoço.

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