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Lemos, gostamos (ou não) e indicamos (ou não). Aqui, colocamos nossas impressões sobre livros que, de alguma forma, nos marcaram. Tem opinião, mas não tem spoiler!

[Resenha] Infância

A realidade árida da savana sul-africana dá o tom do primeiro volume da trilogia de ficção autobiográfica de J. M. Coetzee, um dos maiores escritores contemporâneos. Em Infância – Cenas da Vida na Província (Companhia de Bolso, 150 páginas), Coetzee relata, com a secura que lhe é habitual, seus anos de formação, em busca de uma identidade que não parece estar em lugar nenhum.

A casa em Worcester, para onde mudaram por causa do pai, que tem dificuldade em se fixar em um emprego, é simples, idêntica a todas as outras. O garoto não consegue se habituar ao local, à brutalidade do entorno.

A infância, segundo a Enciclopédia das Crianças, é uma época de felicidade inocente, que se vive nas campinas entre flores e coelhos, ou  junto à lareira absorto num livro de contos. É uma visão da infância totalmente alheia a ele. Nada do que vive em Worcester, em casa ou na escola, o faz pensar que a infância seja mais que uma fase de engolir a seco e suportar.

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[Resenha] O Espírito dos Meus Pais Continua a Subir na Chuva

Não é segredo para os leitores do blog que gosto muito de romances que exploram os artifícios da memória. Já escrevi até um post sobre esse assunto e ressaltei em diversas resenhas a habilidade de certos autores com o tema (Alan Pauls, Javier Marías e Patrick Modiano são alguns exemplos). Era de se esperar, portanto, minha identificação com esta obra do argentino Patricio Pron, intitulada O Espírito dos Meus Pais Continua a Subir na Chuva (Editora Todavia, 158 páginas).

Um jornalista viciado em remédios e com problemas para enfrentar a realidade volta à sua cidade natal, na Argentina, depois de uma longa e confusa temporada na Europa. Ele retorna para rever o pai, que está hospitalizado. Mais do que o reencontro com sua terra e sua família, essa visita traz à tona um acerto de contas com o passado.

O protagonista, assim como seu pai, sofre com alguns problemas de memória. Seus momentos sob o efeito dos remédios e sua infância são borrões que pouco revelam acerca de sua identidade. Já o pai tem dificuldades com a memória recente, especialmente para os fatos rotineiros.

O texto de Pron é repleto de metáforas bem construídas, que recorrem à materialidade do cotidiano para expressar conceitos bastante abstratos como o tempo e a memória. Seu estilo lembra muito o de Alan Pauls, outro grande escritor argentino:

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[Resenha] As Manifestações

Misturar política com literatura dá certo? Em As Manifestações, a escritora francesa Nathalie Azoulai faz uma aposta corajosa e coloca a temática no centro do seu romance. Mais do que um pano de fundo, a política é a engrenagem que move a narrativa.

Virginie Tessier, Anne Toledano e Emmanuel Teper são três amigos que se conheceram no colégio e tiveram uma juventude intensa, participando das manifestações dos anos 80 em Paris. De origens bastante distintas, esse trio encontra suas semelhanças no movimento político de esquerda que contagiou a França nesse período.

Anne nasceu no seio de uma família judia burguesa, muito culta e simpatizante da direita. Emmanuel, filho de intelectuais, cresceu rodeado pelos debates acadêmicos de esquerda. Virginie, filha da classe média francesa, não foi educada em um ambiente politizado, tampouco culto, mas a realidade proletária de seus pais os aproximava da esquerda.

Ainda no colégio, os amigos organizaram sua primeira manifestação em prol de um garoto de origem árabe, de ótimo desempenho escolar, que corria o risco de não conseguir seu diploma, porque sua família estava à beira de ser deportada. Era um período na França em que a esquerda, enquanto movimento de defesa dos direitos das minorias, era o caminho a ser tomado.

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[Resenha] Minha Vida de Menina

Helena Morley começou a escrever Minha Vida de Menina (Companhia de Bolso, 325 páginas) com apenas 13 anos. Isso não significa que ela seja um prodígio da literatura: o livro nada mais é do que um diário adolescente sobre a vida na província. Ao mesmo tempo, é uma leitura saborosa sobre um momento histórico relevante: escrito entre 1893 e 1895, o diário de Morley, pseudônimo de Alice Caldeira Brant, retrata as relações sociais e econômicas em um Brasil afastado das grandes metrópoles e ainda muito marcado pela escravidão, abolida há menos de uma década.

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Morley, apesar da pouca idade, era uma observadora atenta do seu entorno. Filha de mãe brasileira e pais inglês, ela conta, de forma sucinta e bem-humorada, conservando a ingenuidade e o espírito rebelde da adolescência, a relação com os pais, os tios e a avó, a decadência da mineração, a pobreza da família, a vida na escola e os hábitos provincianos de Diamantina, em Minas Gerais, onde nasceu. Leia mais

[Resenha] NW

Nossas origens nos definem? Neste romance, NW, um “épico urbano” nas palavras de Joyce Carol Oates, a escritora britânica Zadie Smith mergulha na multiculturalidade de um bairro londrino para criar quatro histórias que se entrelaçam e comprovam que o destino de um indivíduo é muito mais complexo do que uma simples somatória de contexto e educação.

Os quatro personagens principais – Leah, Natalie, Nathan e Felix – cresceram em Kilburn, na região de NW, bairro londrino moldado por sucessivas ondas migratórias. Na idade adulta, eles voltam a se encontrar, carregando trajetórias e escolhas diferentes, mas um passado em comum.

Natalie, filha de jamaicanos, driblou as expectativas da sociedade, formou-se em Direito, casou-se com um homem rico e desenvolveu uma carreira sólida. Sua vida familiar, no entanto, é uma bomba relógio, muito bem disfarçada, mas prestes a explodir. Leah, melhor amiga de Natalie e de descendência irlandesa, contrariou o sonho da mãe de vê-la em um posto bem remunerado, quando decidiu se dedicar ao trabalho humanitário e casar-se com um imigrante francês, cabelereiro e de ascendência africana. Nathan, errante desde sua adolescência, seguiu exatamente o caminho anunciado: drogas, violência e rua. Já Felix conseguiu superar o vício, mas não os obstáculos para uma carreira promissora. O aspirante a cineasta termina como um mecânico de carros com uma vida amorosa bastante conturbada.

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