Autor: Mariane Domingos (página 11 de 43)

[Resenha] Era Uma Vez uma Mulher que Tentou Matar o Bebê da Vizinha

Impossível ficar indiferente ao título deste livro da russa Liudmila Petruchévskaia: Era Uma Vez uma Mulher que Tentou Matar o Bebê da Vizinha. A cena sombria que ele anuncia e os ares de fábula contidos no “era uma vez” são uma ótima introdução à coletânea de contos dessa autora, que foi censurada na época do regime soviético. Hoje, Petruchévskaia é uma das escritoras e dramaturgas mais reconhecidas do seu país e chega, pela primeira vez, muito bem recomendada, às livrarias brasileiras, com essa edição da Companhia das Letras.

Sua escrita bebe na fonte fantasiosa dos contos de fadas na mesma medida em que lança um olhar afiado sobre a sociedade. Assim, Petruchévskaia se destaca por criar situações e personagens mágicos a partir de problemas reais, como a guerra, a fome, o inverno desolador, a solidão e tudo aquilo que desperta a escuridão da alma humana:

… existe um lado da vida secreto, animal, que floresce teimosamente, e é nele que se concentram as coisas detestáveis e hediondas;

Os contos dessa coletânea são habitados por fantasmas, viúvas e órfãos, uma crítica contundente aos horrores de uma nação que está sempre em combate. Mesmo depois da morte, vítimas e familiares não conseguem encontrar a paz. Em Um Caso em Sokólniki, por exemplo, um soldado morto reaparece para sua esposa para pedir um enterro digno, pois seus restos espalhadas e esquecidos não o permitem descansar.

A ausência é outro tema que perpassa a obra de Petruchévskaia. Se a morte ronda os soldados, a solidão assombra os que ficam à sua espera. Por meio de histórias fantasiosas, a escritora levanta um problema bastante real: o que será dessa geração de órfãos e viúvas?

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“Com frequência fazíamos perguntas cujas respostas já sabíamos. Talvez fizéssemos isso para não precisarmos formular as outras perguntas, aquelas cujas respostas não queríamos saber.”

 

Chimamanda Ngozi Adichie em Hibisco Roxo

[Divã] Ansiedade literária

Estamos em março de 2018. Desde o início do ano, comprei apenas um livro. Passei incólume às promoções de Dia Internacional da Mulher e aos descontos de Dia do Consumidor. Estou orgulhosa de mim, sim ou claro?

Tenho tentado ser menos consumista em todos os aspectos da minha vida. Meu novo mantra é o do personagem Julius no seriado Todo Mundo Odeia o Chris: “se eu não comprar, o desconto é maior”. Mas quero deixar claro que acho a palavra “consumismo” inadequada para literatura já que ela se refere à compra de bens supérfluos. Desde quando livros são supérfluos, rs?! De qualquer forma, achei melhor reduzir as idas às livrarias e nem abro mais os e-mails da Amazon. O que os olhos não veem o coração não sente.

A segunda motivação é que estou com um sério problema de espaço. Meus livros estão espalhados pela casa. Minhas prateleiras já têm duas fileiras. Autores compatriotas ou livros da mesma coleção estão separados porque não cabem mais no mesmo local. Eu e minhas manias de organização sofremos ao ver essa situação. Quando vou fazer uma foto para um post no blog, especialmente as listas que costumam englobar vários títulos, tenho que colocar minha casa abaixo para procurar os exemplares. Também não foram raras as vezes em que quase comprei um livro pela segunda vez, porque alguns títulos estão guardados tão escondidos que me esqueço de que os tenho.

A vontade de economizar e a escassez de espaço, no entanto, não são as principais razões para um 2018 mais contido. Estou trabalhando para diminuir também minha ansiedade literária. Não demorei muito para perceber que o tempo que eu tinha disponível não condizia com meu ritmo de compra de livros. Desde que começamos o blog, eu e a Tatá temos ganhado muitos títulos. Sem contar a assinatura da Tag Livros que traz um exemplar novo todo mês. Resultado? Uma pilha cada vez maior de livros não lidos.

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[Resenha] As Alegrias da Maternidade

Indicação da escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie para o kit da Tag Livros de outubro do ano passado, As Alegrias da Maternidade (Tag Livros, 320 páginas), de sua compatriota Buchi Emecheta, é um romance que faz o leitor perder o fôlego a cada página. Sua narrativa é envolvente não só capítulo a capítulo mas também no todo, já que a escritora costura, com habilidade, episódios cotidianos de personagens fortes a temas áridos como gênero e raça.

Nnu Ego, proganista da história, é filha da paixão entre Agbadi, grande caçador e chefe de um tribo igbo na região de Ibuza, e sua amante Ona, jovem cujo caráter voluntarioso não se adequava aos padrões esperados de uma mulher naquele contexto.

Diferente da mãe, que não queria constituir família, apenas encontrar um homem que a engravidasse de um filho homem para que ela entregasse ao pai e garantisse a continuidade de sua linhagem, Nnu Ego esperava encontrar no casamento e na maternidade sua plenitude. Para ela, não havia outro caminho para uma vida bem-sucedida.

Em seu primeiro matrimônio, já começam as desilusões. Ela se casa com um jovem que era quase um espelho de seu pai – viril, belo, corajoso e líder. A demora para engravidar leva o marido a procurar uma segunda esposa e, quando esta logo lhe dá o que ele tanto procurava, Nnu Ego é marginalizada sob a insígnia de mulher estéril e incapaz de cumprir suas obrigações.

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“O silêncio e a vergonha são contagiosos; a coragem e a fala, também. Mesmo agora, quando as mulheres começam a falar de suas experiências, vêm outras em apoio e partilham as suas próprias. Derruba-se um tijolo, depois outro; a represa rompe, as águas se precipitam.”

 

Rebecca Solnit em A Mãe de Todas as Perguntas – Reflexões sobre os Novos Feminismos

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