Que começo, queridos leitores! Em pouco mais de 20 páginas, Leïla Slimani já conseguiu prender nossa atenção. Foi difícil interromper a leitura, rs! Para a próxima semana, avançamos até o capítulo 10, que termina na página 52.
Mariane Domingos e Tainara Machado
Canção de Ninar já entrou para aquela lista de livros com inícios arrebatadores. Logo nos primeiros parágrafos, Slimani nos coloca frente a frente com uma cena aterradora: duas crianças mortas e uma mãe em choque. A vivacidade de suas descrições, tanto dos aspectos físicos quanto das emoções, é notável. Impossível não partir avidamente para o próximo capítulo.
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Passado o clímax, Slimani volta no tempo e introduz um diálogo frívolo entre o casal Paul e Myriam. Uma boa sacada narrativa, para que o leitor recupere o fôlego, ao mesmo tempo em que começa a saciar sua curiosidade sobre as causas daquela tragédia. Nós, leitores, nos sentimos um pouco como os vizinhos que testemunham toda movimentação do resgate:
Choram e querem saber. Ficam na ponta dos pés. Tentam descobrir o que acontece atrás do cordão de isolamento (…).
Aos poucos, Slimani nos insere naquele ambiente familiar. Descobrimos que o casal tem dois filhos pequenos e que a mulher voltou a trabalhar há pouco. Após um período de dedicação exclusiva às crianças, Myriam começa a sentir a necessidade de preencher suas horas com outras responsabilidades além da de mãe:
Invejava o marido. À noite, esperava ansiosa atrás da porta. Passava uma hora se queixando dos gritos das crianças, do tamanho do apartamento, da falta de distrações. Quando ela o deixava falar e ele contava as sessões de gravação épicas de um grupo de hip-hop, ela replicava:
– Você tem sorte.
– Não, você é que tem sorte. Eu queria muito ver eles crescerem – ele respondia.
Nesse jogo, nunca havia vencedor.
A partir de diálogos cotidianos, Slimani introduz reflexões sociais urgentes como essa que coloca em xeque a configuração familiar machista, na qual a mulher é a única responsável pelos cuidados com a prole. Não só nesse trecho, mas também em outros momentos em que o marido tenta demover Myriam da ideia, chegando até a insinuar que o que ela ganharia seria suficiente apenas para pagar os serviços de uma babá, fica claro o debate que Slimani estimula. As necessidades da esposa estão sempre em segundo, se não em terceiro plano. Frequentemente, são encaradas como caprichos.
Uma vez que Myriam consegue convencer o marido, começa então a busca por uma babá. Mais uma oportunidade para que a autora destaque outras problemáticas sociais. A começar pela exploração e marginalização da mão-de-obra imigrante, explicitada na relutância do casal em contratar, mesmo que a um preço mais baixo, uma babá que não tivesse situação regularizada ou que fosse magrebe como a própria Myriam era.
Saltam aos olhos ainda o sentimento de posse e a dependência que pautam esse tipo de relação de trabalho. Os patrões exigem que a candidata cuide dos seus filhos, mas, caso ela própria seja mãe, será considerada mais apropriada para a posição se deixá-los à deriva. Quais são os limites entre trabalho e vida pessoal? Para amiga de Myriam, nenhum:
– A babá tem dois filhos aqui, acaba que ela nunca pode ficar até mais tarde ou vir de vez em quando no final de semana. Não é muito prático. Pense nisso quando fizer as entrevistas. Se ela tiver filhos, é melhor que não estejam na França.
Como não lembrar aquela reportagem perturbadora, que circulou há um tempo, sobre a discriminação de babás em um dos clubes da elite carioca? Há um trecho da matéria em que uma das entrevistadas, quando questionada sobre o tempo que ela passa com seus filhos, ela diz, chorando: “Perdi o aniversário do meu filho. Era o dia das mães, e eu estava aqui no clube. Trabalhando”. Se Slimani conseguiu desenvolver essa história no contexto da França, imagine quanto material ela não teria no Brasil, cuja história social é marcada pelo servilismo?
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Achados & Lidos
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14 de abril de 2018 at 23:49
O Livro e envolvente, mas confesso que me deixou triste, pois e realista e pessimista. Quando era estudante de direito e fazia estagio, costumava pegar o onibus com o mesmo motorista e cobradora. Um dia a cobradora com um grande sorriso me disse que agradecia, pois todo dia de manha eu falava “bom dia” para eles. Para falar a verdade, nunca percebi que esse gesto tivesse tamanho significado. Recomendo o Livro pois nos faz refletir sobre as nossas acoes e a forma como nos relacionamos com as pessoas.