O encontro entre a paixão de Dorian Gray com seus amigos se mostrou uma verdadeira tragédia grega, levando o personagem a um dilema: deveria criar consciência sobre suas ações ou se entregar a uma vida de prazeres e pecados? Curioso para saber a decisão de Gray? Leia o post completo no blog! Para a próxima semana, avançamos os capítulos 9 e 10 de O Retrato de Dorian Gray, de Oscar Wilde, até a página 148, se você tem a edição da foto, da Penguin-Companhia.
Por Mariane Domingos e Tainara Machado
A paixão arrebatadora de Dorian Gray por Sibyl Vane foi tão repentina quanto fugaz, como já esperávamos. O amor do jovem não resistiu ao primeiro encontro dela com seus amigos e se espatifou, mais uma vez evidenciando a superficialidade dos sentimentos guardados por Gray, estimulado por Lord Henry.
A apresentação de Sibyl Vane como Julieta para uma plateia cheia, comporta também por Lord Henry e Basil Hallward, se mostra um verdadeiro desastre. Ao subir ao palco, a jovem atriz toma um ar de curiosa indiferença, e declama mesmo as mais belas das passagens com um tom artificial, falso.
Encerrada a apresentação, entendemos um pouco melhor a mudança de tom na atuação de Sibyl Vane, em uma oposição entre idealização e realidade, entre a superficialidade dos sentimentos e a verdade das intenções de um e outro. Para Vane, o amor verdadeiro tinha um valor mais elevado do que as paixões representadas na arte, tornando sua atuação medíocre quando descobre o que é se apaixonar. A realidade, no seu caso, tinha um peso maior do que as aparências.
O mesmo não vale para o amor superficial de Dorian Gray, encantando apenas por uma imagem idealizada da atriz, que precisava ser chancelada por seus amigos. Quando a apresentação se demonstra um fiasco e Lord Henry classifica a atriz apenas como “adorável”, Gray logo refuta seu romance e sua paixão, até então ardorosa. A voz da sensibilidade, representada por Hallward, o amigo pintor, para quem “o amor é mais maravilhoso do que a arte”, pouco pode fazer para reverter a impulsividade que continua a ser a força que move o personagem principal deste romance. Gray decide terminar tudo a jovem pela qual se dizia loucamente apaixonado poucas horas antes, mesmo diante de súplicas.
Um dos pontos mais notáveis no estilo adotado por Oscar Wilde é o modo como ele usa rebuscadas descrições de paisagens e locais para acentuar os sentimentos vivenciados pelos personagens. Ao sair do teatro decadente com personagens antiquados e roupas rasgadas, Gray parece finalmente enxergar as feias nuances do mundo pelo qual se encantou, voltando seu olhar para a opulência de sua própria casa. Wilde cria assim a ambientação necessária para a eterna contradição em que Gray parece estar preso.
Essa contradição se acentua quando, ao chegar em casa, o personagem vislumbra o quadro pintado por seu amigo Hallward, que parece agora ter uma aparência cruel.
A luz do sol, oscilante, ardente, mostrou-lhe os traços de crueldade em torno da boca com muita clareza, como se estivesse se olhando em um espelho depois de ter feito algo terrível.
Gray se põe então a relembrar o que havia dito a si mesmo quando viu o quadro pronto pela primeira vez, como tinha desejado que o quadro envelhecesse e amargasse o peso de suas decisões e pecados para que ele pudesse manter sua aparência jovem, com viço e pureza. Se esse desejo impossível havia se concretizado, Gray logo faz o questionamento central para o livro:
…(o quadro) continha o segredo de sua vida e contava sua história. Ele havia lhe ensinado a amar a própria beleza. Será que o ensinaria a detestar a própria alma? Voltaria a olhar para ele de novo?
Ao enxergar a crueldade com que tratou Sibyl Vane, Gray se enche de remorso e decide se afastar de Lord Henry, ponderando que viveria dali para frente uma vida virtuosa, que o quadro seria sua consciência. A resolução, contudo, dura uma noite, até que Lord Henry traga a notícia de que Sibyl Vane se matou na noite anterior. Gray então afirma:
Lembro que uma vez você disse que existe certa fatalidade nas boas resoluções – que elas são tomadas sempre tarde demais.
No embate entre sua breve criação de consciência e o encanto de Lord Henry, que narra os fatos como se o personagem fosse o protagonista de uma verdadeira tragédia grega, Dorian Gray faz sua escolha:
Sim, a vida decidira por ele — a vida, e a infinita curiosidade sobre a vida. Juventude eterna, paixão infinita, prazeres sutis e secretos, alegrias extremas e pecados ainda mais extremos – ele teria tudo. O retrato carregaria o peso de sua vergonha: era tudo.
Achados & Lidos
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12 de fevereiro de 2018 at 14:16
Confesso que nos 2 capítulos anteriores a estes, estava meio com birra do livro porque tenho uma impressão forte de que no caso de Wilde muitas vezes ele cria determinadas cenas na narrativa apenas pra justificar um conceito meio filosófico que ele vai acrescentar, quase sempre trazido por L. Henry. Nessa sequência, acho que isso ficou mais orgânico. No fim, dá vontade de dar uns tapas na cara do Dorian Gray, principalmente numas falas bem misóginas dele, mas aí a gente contextualiza pra não abandonar o livro hahaha finalmente alcancei a leitura 🙂
18 de março de 2018 at 17:10
Siiim! Há umas falas bem misóginas no livro que exigem mesmo um exercício constante de contextualização… E concordo: nem sempre o Wilde consegue fazer a transição da da teoria para prática de forma muito sutil.