Como ainda estamos no mês das crianças, nada melhor do que listar aqueles livros inesquecíveis que marcaram o começo da nossa vida de leitor e abriram as portas para todo um universo que nos esperava nas estantes de casa. De Monteiro Lobato a Ziraldo, passando por Harry Potter, claro, aqui estão cinco livros que marcaram minha infância e foram essenciais para desenvolver minha paixão pelo mundo literário – e que continuam a encantar novas gerações de leitores.
1. Memórias de Emília, de Monteiro Lobato: A Emília era de longe minha personagem favorita do Sítio do Pica-Pau Amarelo, a série escrita por Monteiro Lobato. A boneca irreverente e inteligente, sempre com uma pergunta perspicaz na ponta da língua de pano, foi das primeiras personagens femininas fortes que guiariam meu gosto pela leitura nos anos seguintes.
Emília, que ganhou o dom da fala ao ingerir uma pílula dada pelo Doutor Caramujo, decide escrever suas memórias e atribui a missão ao Visconde de Sabugo. Entre pérolas sobre filosofia e linguagem, Monteiro Lobato faz das narrações de Emília uma reflexão interessante sobre biografias, verdades e mentiras. Uma leitura que não envelhece!
Eu penso que todas as calamidades do mundo vem da língua. Se os homens não falassem, tudo correria muito bem, como entre os animais que não falam. As formigas e as abelhas, por exemplo. Esses bichinhos vivem na maior ordem possível, com suas comidinhas a hora e a tempo – e que comidas! (E qual o segredo da felicidade desses animaizinhos? Uma só: não falam. No dia em que derem de falar, adeus ordem, adeus paz, adeus mel! A língua é a desgraça dos homens da terra.
2. Harry Potter e a Pedra Filosofal, de J. K. Rowling: Hoje sabemos que a carta de Hogwarts não chegou e nem vai chegar, mas aos 12 anos, mais ou menos a idade que tinha quando descobri a saga do menino órfão que é convidado para uma escola de magia, esse mundo paralelo parecia totalmente possível.
– Ah, vão tomar banho, vocês dois – disse Hagrid. – Harry, você é um bruxo.
O casebre mergulhou em silêncio. Ouviam-se apenas o mar e o assobio do vento.
– Eu sou o quê? – ofegou Harry.
– Um bruxo, é claro – repetiu Hagrid, recostando-se no sofá, que gemeu e afundou ainda mais -, e um bruxo de primeira, eu diria, depois que receber um pequeno treino. Com uma mãe e um pai como os seus, o que mais você poderia ser? E acho que já está na hora de ler a sua carta. Harry estendeu a mão finalmente para receber o envelope meio amarelo (…)
Fui parte da primeira geração que sonhou em ir para Hogwarts, pensou no que o chapéu nos diria e tem seu feitiço e seu objeto mágicos favoritos (Accio e o Espelho de Ojesed). Lembro bem do nosso “primeiro encontro”, em uma feira do livro no colégio, quando instalaram vários caldeirões repletos de livros. Foi paixão à primeira vista, que se transformou em uma linda relação de longo prazo.
3. A Droga da Obediência, de Pedro Bandeira: A história, ambientada em um colégio tradicional de São Paulo, não poderia ter um apelo mais óbvio para os pré-adolescentes: mistério, suspense e cinco amigos dispostos a solucionar um crime.
A Droga da Obediência foi o primeiro livro de Pedro Bandeira protagonizado pelos Karas, os cinco amigos sempre envolvidos em mistérios que ainda apareceriam em mais quatro livros do autor, com fórmulas razoavelmente parecidas.
Nesse primeiro título da série, o doutor Q.I. cria uma droga capaz de dominar pensamentos e ações e começa a testá-la em alunos dos principais colégios de São Paulo, com o objetivo de, claro, conquistar o mundo. Apesar do mote meio “Pink e Cérebro”, a história é divertida, cheia de códigos e comunicações secretas, uma fórmula que conquistou minha classe inteira na quinta série.
O coração de Miguel bateu apressadamente. Havia alguma coisa estranha, alguma coisa muito estranha no ar. E ele decidiu que a situação não era para confiar. Mas, e Chumbinho? Será que ele conhecia mesmo todos os sinais e códigos secretos dos Karas?
– Acho que fui eu, sim – ia dizendo o menino no momento em que Miguel cruzou os braços.
Sim. Chumbinho sabia o que significavam os braços cruzados. Era o sinal de silêncio dos Karas. Equivalia a um dedo encostado nos lábios, só que ninguém sequer desconfiava. Era preciso ser um Kara, e Chumbinho, agora, era um deles
4. O Pequeno Nicolau no Recreio, de Sempé & Goscinny: Quem lê o blog com frequência deve se cansar das paixões platônicas que eu e a Mari compartilhamos. Mas em uma lista sobre literatura para crianças, seria impossível deixar O Pequeno Nicolau de fora. A série poderia ter ficado datada, já que Nicolau frequentava um colégio só para meninos, no qual ainda havia castigos e um código bem mais estrito de conduta que o atual. Mas a empatia com a visão de mundo de Nicolau, que narra os acontecimentos familiares e escolares em primeira pessoa, é imediata.
Nós entramos no museu em fila, bem comportados, porque a gente gosta da nossa professora e nós percebemos que ela estava muito nervosa, como a mamãe, quando o papai deixa cair a cinza do cigarro dele no tapete. Entramos numa sala grande com um montão de quadros pendurados na parede. “Aqui vocês vão ver quadros executados pelos grandes mestres da escola flamenga”, a professora explicou. Ela não pôde continuar por muito tempo, porque um guarda chegou correndo e gritando, porque o Alceu tinha passado o dedo num quadro para ver se a tinta ainda estava fresca.
Além das travessuras dos colegas de escola, o modo como Nicolau percebe os pequenos atritos na relação dos pais rende boas risadas, como aqui nesse Marque a Página. O Pequeno Nicolau no Recreio foi o primeiro título que li da série e ainda guardo a edição bem antiga da Martins Fontes, de 1991, com amor e carinho. Por isso, foi esse o volume selecionado para a lista, mas qualquer um da série é diversão garantida!
5. O Menino Maluquinho, de Ziraldo: Ziraldo é outro autor onipresente nas estantes de livro infantis. Fiquei muito em dúvida entre esse livro e Uma Professora Muito Maluquinha, uma história igualmente cativante, mas acabei me decidindo pelo primeiro por ser a obra mais famosa do cartunista e escritor.
Com seu desenho de traços longos e exagerados, Ziraldo costuma marcar a passagem dos livros quase exclusivamente de figuras das crianças pequenas para as edições com um pouco mais de texto. A história do menino que tinha asas no pé e macaquinhos no sótão tem a mistura de ação, criatividade e amor capaz de encantar adultos e crianças. É um dos retratos mais bonitos da ingenuidade e da pureza da infância.
Depois entrava o menino com seu pé de vento e a casa ventava os quartos cantavam e tudo se enchia de som e alegria. E a cozinheira dizia: “Chegou o maluquinho!”
Tive que deixar muitos livros queridos de fora, mas esses são meus preferidos. Contem para gente quais livros foram marcantes para sua infância!
Tainara Machado
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